sábado, 17 de maio de 2014

Motocicletas Chinesas - Fatos e Mitos - Parte III

** Por Arlindo Romero, para a Revista Motociclismo.

O terceiro e último capítulo deste especial "fatos e mitos" trata da capacidade da indústria chinesa de atender a outros mercados. A primeira regra para se atender bem um cliente é entender exatamente o que ele precisa. No caso das motocicletas, quase sempre existe um abismo entre precisar e querer. 
É exatamente em entender seus clientes que a indústria chinesa, aqui no Brasil, tem seu ponto mais fraco. Por não conseguir entender as necessidades do cliente final, que vai usar a moto todos os dias, ela acaba vendendo aquilo que o importador quer comprar. É fato que a maioria dos importadores brasileiros não eram, e alguns ainda não são, profissionais do ramo de duas rodas. 
Recentemente, em um evento do setor motociclístico brasileiro, ouvi de um alto executivo de uma importadora a seguinte pérola: "Não sei andar de moto e não gosto de motos, só gosto de ganhar dinheiro com motos". Em outro caso, quando questionei o responsável pela reposição de peças sobre a qualidade e a quantidade do estoque no Brasil, a resposta foi: “Não nos preocupamos com isso, todas as nossas peças podem ser encontradas no mercado paralelo".
Em uma pesquisa sobre clientes insatisfeitos com motos chinesas, feita em sites voltados a coletar reclamações, ficou evidente que em mais de 95% dos casos a responsabilidade ou culpa foi exclusivamente do importador. As marcas mais responsáveis levam meses, às vezes anos, até definir o produto ideal para cada mercado. Alguns importadores definem isso com base na oferta do dia nas grandes feiras chinesas do setor. Em alguns casos, ainda tropicalizam a moto com componentes de 2ª e 3ª linha, melhorando o preço e aumentando o lucro. 
Segundo John Ruskin, escritor inglês do século 19, “não há nada no mundo que alguém não possa fazer pior e mais barato; quem considera somente o preço acaba sendo a merecida vítima”. Como não podemos ir até a China escolher e comprar nossas próprias motos, a solução é escolher criteriosamente de quem vamos comprá-las aqui. 
Acredito que até aqui todos já entenderam o “espírito da coisa” e perceberam que o maior desafio em ter uma moto chinesa é quanto aos serviços prestados no Brasil pelos importadores. Não adianta “perguntar” ao vendedor. Por dever de ofício, ele sempre vai responder o que você espera ouvir. Vá à oficina e converse com os mecânicos, verifique quantos fizeram cursos, peça para ver os diplomas. 
No balcão de peças, escolha algumas que podem parar a moto, como freio, cabos, e veja se estão disponíveis imediatamente, isso é seu direito e, se alguém achar ruim, é um mau sinal. Com paciência e uma conexão rápida, não existe segredo para a internet, portanto, pesquise. Quanto à falta de qualidade dos produtos, é claro que aí também existem problemas, mas a vontade de resolver isso por parte da indústria chinesa é muito grande. Eles já descobriram que o sucesso no Brasil é o passaporte carimbado para outros mercados emergentes.
Para encerrar, um alerta: a partir de 1º de janeiro de 2014 entrou em vigor a primeira fase do PROMOT IV, legislação brasileira que regula a emissão de poluentes, um prato cheio para empresários inescrupulosos comprarem lotes de motos “fora do padrão” a preços convidativos e vendê-las por aqui. Portanto, atenção em dobro.

Antes de comprar uma moto chinesa, proponho os quesitos a serem julgados antes da decisão de compra, num total de 20 pontos:

1. Motivação pessoal – por que você escolheu determinada moto?
a) Porque estou apaixonado por ela e nada vai me fazer mudar. 20 pontos. (Boa sorte e, por favor, não conte a ninguém que você leu esta matéria).
b) Porque, aparentemente, atende as minhas necessidades de lazer e trabalho. 1 ponto.
c) Porque é a mais barata da categoria. Menos 2 pontos.

2. Importador
a) É o próprio fabricante na China. 3 pontos.
b) Importador local que já era do segmento motociclístico. 2 pontos.
c) Importador local do segmento de carros. 1 ponto.
d) Importador local que “caiu de paraquedas” nas motos. Menos 2 pontos.

3. Marca
a) A mesma marca usada na China. 2 pontos.
b) Marca local, mantendo a marca original. 1 ponto.
c) Marca local, omitindo a marca original. Menos 2 pontos.

4. Distribuição geográfica no Brasil
a) Concessionários nas principais cidades (mais de 120). 2 pontos.
b) Somente nas capitais e algumas cidades (menos de 60). 1 ponto.
c) Somente na cidade do importador e na cidade de alguns amigos. Menos 2 pontos.

5. Treinamento da rede
a) Centro de treinamento próprio, com instrutores formados na China.3 pontos.
b) Centro de treinamento próprio, com instrutores “autodidatas”.1 ponto.
c) “Centro de treinamento, que centro?” Menos 2 pontos.

6. Manuais de serviço para as oficinas
a) Editados em português, de todos os modelos vendidos pela marca.2 pontos.
b) Editados em inglês. 1 ponto.
c) Não precisamos de manuais, é só usar os daquela marca japonesa.0 ponto.
d) Serve o do proprietário? Menos 3 pontos.

7. Ferramentas especiais
a) Temos. 1 ponto.
b) Não temos. 0 ponto.
c) Não precisamos. Menos 2 pontos.

8. Catálogo de peças
a) Disponível pela internet ou via sistema para toda a rede. 2 pontos.
b) Disponível em papel. 1 ponto.
c) “É só me dizer o nome da peça que eu dou um jeito.” Menos 2 pontos.

8.1 Peças de reposição
a) Embaladas individualmente com a marca original. 2 pontos.
b) Em grandes caixas na prateleira, com inscrições chinesas. 1 ponto.
c) “Nós não temos, mas o senhor vai encontrar naquela loja ali da esquina.” Menos 3 pontos.

9. Peças pintadas
a) Cores classificadas e codificadas confor­­­­me norma internacional.1 ponto.
b) Tintas disponíveis nas revendas. 0 ponto.
c) “Não se preocupe, é só levar uma peça pintada que qualquer loja faz a nossa tinta.” Menos 2 pontos.

10. Garantia
a) Por um período determinado, com quilometragem livre em todo o território nacional. 1 ponto.
b) Somente na revenda em que você comprou a moto. 0 ponto.
c) “Nem se preocupe com isso, mas se acontecer alguma coisa, vem conversar comigo”. Menos 5 pontos.


*Esta reportagem foi publicada originalmente na edição nº 181 da MOTOCICLISMO. Por este trabalho, o consultor Arlindo Romero recebeu "Menção Honrosa" na edição 2013 do Prêmio Abraciclo de Jornalismo, na categoria Revista.

Um comentário:

  1. Perfeito, Esses Pontos Valem Para Qualquer Marca, Eu Levo A Serio Esses Quesitos.

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